sexta-feira, 30 de outubro de 2015

Parabéns, você é invisível!

Este blog nasce da experiência própria de sentir na pele a invisibilidade.
Mulheres descobrem a invisibilidade a partir dos 35 anos ou quando se tornam
1) gordas;
2) enrugadas;
3) velhas;
4) feias;
5) estéreis;
6) e/ou todas as possibilidades acima.

Essa invisibilidade é sacramentada pelo desprezo quase absoluto da sociedade e dos meios de comunicação por mulheres que não tenham

1) de 12 a 25 anos;
2) cabelos longos e lisos;
3) entre 48 e 52 quilos;
4) carreira artística;
5) carreira para-artística (BBB, ajudante de palco, namorada de atleta/artista, atuação seminua ou totalmente nua em publicações/vídeos/televisão);
6) e/ou todas as possibilidades acima.

A imensa maioria das mulheres só terá fotos suas publicadas nas redes sociais, em poses de ostensiva felicidade, junto a amigos. As que podem ser do interesse dos meios de comunicação por sua carreira profissional, invariavelmente, enfrentarão entrevistadores que lhes perguntaram como elas conseguem tempo para manter lar/família/vida afetiva ou por que não constituíram família, nem têm vida afetiva. Se essas mulheres envelhecem no exercício profissional, invariavelmente, serão consideradas guerreiras ou mal-amadas, cuja ascensão na carreira se deu por laços consanguíneos ou amorosos com homens que as apoiaram.

A segunda década do terceiro milênio, embora não tenha reduzido o culto à juventude, apresenta uma saudável reação de jovens feministas aos abusos cometidos contra qualquer mulher - apenas por ter nascido mulher. Tem campanha contra as grosserias ditas pelos homens a quem passa na rua, esforços para coibir os assédios morais em local de trabalho e denúncias de avanços indevidos e estupros. E uma postura mais contundente em relação a todo o tipo de discriminação sofrido por mulheres.

No entanto, quem passou dos -  sejamos generosas -  43 anos, quem não pode mais se considerar "menina", essas mulheres maduras ficaram invisíveis não apenas sexualmente. Elas não são mais vistas nem procuradas para reflexões sobre a condição feminina na atualidade, via de regra. Com exceção de formadoras de opinião, artistas ou celebridades em geral, não há interesse por essa cidadã de segunda classe. Enquanto revistas clamam pelo dever de manter-se em forma sensual e fisicamente, essa mulher é esquecida no momento de definir propostas políticas. Ou ao menos, nada do que pode ser feito por ela, excetuando-se as campanhas de prevenção de câncer, merece ser noticiado.

Envelhecer é difícil. Dói, literalmente. Mas ao idoso a atenção é quase sempre acompanhada por repreensões e advertências, que se iniciam na maturidade. O cidadão, pensador, ativo politica e culturalmente cede seu lugar para um ser incapaz de expor-se ao sol em horários "adequados", alimentar-se de maneira correta, exercitar-se e, além de tudo, "curtir a vida adoidado" - desde que distante de excessos.

Sabedoria, a gente adquire. Duro é reconhecer o fim da beleza física, o comprometimento do corpo. Pior ainda é ser ignorada por quem está em volta. Deve ser pior para os homens, que não estão acostumados com o conformismo social. Coletivamente, existe como mudar isso? Há algum interesse das mulheres maduras em se juntarem, como as jovens, para se manterem protagonistas das próprias vidas, sem render-se ao desprezo social?

Enquanto penso, empurro a vida e encolho a barriga.






Ute Rathmann - Hommage à Klimt XX